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É a década do rock and roll, do movimento Beat, da beleza vertiginosa de Brigitte Bardot, da chegada da televisão no Brasil, do primeiro título mundial da Seleção Brasileira de Futebol, da primeira Bienal de Arte de São Paulo, do estrondoso sucesso do filme 'Cantando na Chuva'. Ainda nessa década um coração artificial é utilizado pela primeira vez em um ser humano, o Cinemascope chega ao cinema, Getúlio Vargas cria a Petrobrás, Marilyn Monroe se torna estrela em 'Os Homens Preferem as Loiras'. Por duas polegadas a mais nos quadris Marta Rocha não vence o Miss Universo, Vargas comete suicídio, Juscelino Kubitschek é eleito governador de Minas Gerais e, posteriormente, presidente do Brasil e, em Cuba, o ditador Fulgencio Batista é deposto pela Revolução. Enquanto isso, na Belo Horizonte de 1952, entre mesas de bilhar, copos de cerveja, cigarros e a efervescência de sua vida boêmia, nasce a ousadia, o deboche e o humor do Binômio. Um jornal político de oposição que abala o provincianismo da jovem capital de Minas Gerais que, exalando cheiro de progresso, caminha para a metropolização.

Em 17 de fevereiro de 1952, um órgão "quase independente" chega às bancas impresso em "4 páginas tablóide de péssima qualidade, composto manualmente e rodado em uma velha impressora que tirava pouco mais de mil exemplares hora" (RABÊLO, 1997, p.15). Com a manchete "TAMBÉM SOMOS DA QUEBRADEIRA" no seu primeiro número (em caixa alta, como que num grito sísmico capaz de fazer tremer do Hotel Financial, na Avenida Afonso Pena, ao Palácio da Liberdade), o jornal anunciava aos belorizontinos sua posição nada recatada, submissa ou comprada. Era, enfim, o marco de uma nova era no jornalismo de Belo Horizonte, de Minas e do Brasil. Um rock and roll jornalístico que "virou Minas de cabeça para baixo".

José Maria Rabêlo tinha apenas 23 anos quando fundou, com o amigo Euro Luiz Arantes, de 24 anos, o jornal Binômio. Munidos de uma máquina Olivetti, e sem uma redação ou empregados, cabia aos dois a função de colocar nas ruas um jornal alternativo que agregava suas experiências profissionais anteriores com a vontade de dizer o que não era permitido em outros jornais. A estratégia? O humor. E já no seu título ele declarava sua verve humorística e provocativa ao transformar o nome do plano de governo do governador de Minas Gerais, Juscelino Kubitschek, em sua própria identidade:

 

Juscelino tinha lançado seu programa de governo, baseado no que chamou de Binômio Energia e Transportes, que acabaria sendo apenas Binômio e como ficaria popular em todo o Estado, graças a uma propaganda milionária como nunca se vira em Minas. Era Binômio pra cá, Binômio pra lá, nas rádios, nos jornais, nas ruas, em toda parte. Então nós pensamos: contra esse Binômio da propaganda e da mentira, Energia e Transportes, vamos criar o Binômio da verdade, Sombra e Água Fresca (RABÊLO, 1997,  p.15).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Com apenas mil exemplares impressos na primeira edição, e logo reimpressos três vezes até chegarem a seis mil exemplares, o sucesso foi imediato. O que Fernando Mitre chamou de "coragem no conteúdo" (RABÊLO, 1997, p.157) foi a linha editorial traçada pelo jornal até o fim. Textos afiados com a realidade da cidade e do país, o deboche a tudo e a todos, a informalidade, o jogo de palavras, as denúncias e as inovações gráficas e de marketing que se seguiram ao longo dos anos, colocaram o Binômio em local de destaque nas bancas de jornal da capital. Durante seus doze anos de existência, incluindo um período com edições feitas especialmente para Juiz de Fora a partir de 1958, sua tiragem crescia vertiginosamente e batia recordes. Em pouco tempo já se tornava o jornal mais vendido de Belo Horizonte, como mostra uma pesquisa da agência de propaganda Standard (atualmente Standard, Ogilvy & Mather):

(Pesquisa feita) em agosto de 1958, junto aos 182 pontos de venda da cidade, apontou-o como o mais vendido em Belo Horizonte. O resultado foi o seguinte: Binômio, 10.730; Estado de Minas, 9.148; Diário da Tarde, 5.240, e outros menos votados. Ele ganhava em todas as bancas, mas disparava na que ficava na Praça da Liberdade... (RABÊLO, 1997,  p.34).


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Os números não paravam de crescer. Atingiu seu auge no final da década de 1950, quando, em 1959, a tiragem média batia os cinquenta mil exemplares, "muito superior à do segundo jornal, que era de trinta e sete mil, segundo suas próprias declarações", relatou José Maria (RABÊLO, 1997, p.38). Em edição de março de 1959 uma manchete anunciava: "publicitários confirmam a nossa tiragem de 52.210 exemplares". O quadro é ainda mais impressionante quando comparamos os exemplares vendidos com a população de Belo Horizonte ao final daquela década: quase quatrocentos mil habitantes. Atualmente, a cidade conta com cerca de dois milhões e trezentos mil habitantes e o jornal antes competidor direto do Binômio, Estado de Minas, tem uma média de circulação de quarenta e oito mil exemplares/dia, segundo o IVC* (Instituto Verificador de Tiragens). O Binômio instituiu um sistema de validação e contagem das tiragens antes mesmo da criação do IVC. Funcionava assim: a cada semana, representantes de diferentes agências de propaganda fiscalizavam a impressão na gráfica, no Rio de Janeiro, e a distribuição dos jornais nas bancas podendo, assim, atestar o número de cópias em circulação. Sua autonomia e pioneirismo, portanto, não se restringiam apenas à forma e ao conteúdo do jornal.

* Média de circulação de jornais de Minas Gerais ano 2015 no ranking nacional: 1º Super Notícia (249.297) / 12º Aqui (73.989) / 13º O Tempo (60.055) / 15º Estado de Minas (48.695). FONTE http://www.anj.org.br/maiores-jornais-do-brasil/

REFERÊNCIA:

RABÊLO, José Maria. Binômio - edição histórica: O jornal que virou minas de cabeça para baixo. Belo Horizonte: Armazém de Ideias/Barlavento Grupo Editorial, 1997. 260 p.

"Um jornal político de oposição que abala o provincianismo da jovem capital de Minas Gerais que, exalando cheiro de progresso, caminha para a metropolização."

Década de 1950

Belo Horizonte

José Maria Rabêlo

Euro Luiz Arantes

Década de 1950

Texto de Paulo Mendes Campos
Texto de Paulo Mendes Campos
Texto de Paulo Mendes Campos

Pesquisa desenvolvida por Lucas Rossi - 2017. Imagens do acervo da Biblioteca central da UFMG.

BINÔMIO 1952 - 1964

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